Tive a honra de intervir na Sessão Solene Comemorativa do 25 de abril da Assembleia Municipal de Faro, onde defendi o acesso à habitação como um efetivo Direito para todos, a par do Direito à Educação e à Saúde.
Ouve e lê a intervenção completa aqui:
Exmo. Senhor Presidente da Assembleia Municipal
Exmo. Senhor Presidente da Câmara Municipal e senhores vereadores,
Exmos. Senhores Presidentes das Juntas de Freguesia,
Caros Membros da Assembleia Municipal,
Magnífico Reitor da Universidade do Algarve,
Representantes diplomáticos, militares, civis e religiosos,
Caros concidadãos e munícipes,
Minhas senhoras e meus senhores,
Estamos aqui hoje para comemorar o 25 de Abril de 1974, o marco mais importante da história recente do nosso país. Foi precisamente há 49 anos e é importante celebrarmos esta data mais do que nunca.
Falta um ano para o quinquagésimo aniversário da Revolução dos Cravos e o seu legado é incontestável, desde logo por ter dado voz e poder às populações e ao exercício político de proximidade através da autonomia do poder local, dos Municípios e das Freguesias, com órgãos autárquicos democraticamente eleitos, o que nos permite estar aqui hoje, juntos, a comemorar o 25 de abril de 1974.
Gostaria nesta intervenção de destacar o fundamental papel dos jovens Capitães de Abril na conquista da democracia para o nosso país.
Salgueiro Maia, com 29 anos, Vasco Lourenço, com 31 anos, Otelo Saraiva de Carvalho, com 37 anos, entre tantos outros que, apesar de ainda jovens, tiveram a coragem de arriscar as suas vidas contra a guerra e contra a opressão, para libertarem o povo português de uma ditadura que durou mais de 48 anos. Devemos estar-lhes gratos e honrar o seu legado.
Mas devemos perguntar-nos:
Que legado será este?
Que conquistas teremos conseguido para o nosso país e para o nosso povo?
Que exemplos teremos para mostrar ao mundo quando em 2074, se assinalarem os 100 anos do 25 de abril?
Hoje, depois de tantas conquistas de Abril, como a proteção social no desemprego e na doença, o direito universal de voto para todos os cidadãos portugueses com mais de 18 anos, a consagração de direitos da mulher, a adesão à CEE, o Serviço Nacional de Saúde, a escolaridade obrigatória, a escola pública a Universidade do Algarve e o acesso à cultura, ainda temos muito por fazer:
Falo-vos da pobreza e a fome;
Das consequências das alterações climáticas, que muitos continuam a negar ou a desvalorizar;
Do direito à água e o seu uso inteligente;
As guerras, que continuam a matar por este mundo fora, agora, de novo, também aqui na Europa.
Permitam-me, a este respeito, uma palavra de solidariedade para todos os refugiados ucranianos e para as vítimas desta guerra, despoletada pela ilegítima invasão do seu território por parte da Rússia e que encontrou pela frente a vontade do povo ucraniano em aderir à União Europeia e aos seus valores da Paz, da Democracia, dos Direitos Humanos, do Estado de Direito e da Solidariedade.
Não podemos ficar indiferentes!
Como disse Elie Wiesel, antiga vítima do holocausto e prémio nobel da paz, a indiferença é uma condição contranatura, que permite o caos e a confusão entre o bem e o mal.
Será possível considerarmos a indiferença uma virtude?
Podemos viver as nossas vidas sem preocupação, como se nada de mal se passasse à nossa volta, enquanto outros passam por enormes dificuldades, algumas delas longe da nossa imaginação?
É claro que é muito mais fácil desviarmos o olhar e assim evitarmos interrupções nas nossas vidas e nos nossos sonhos. Também sei que pode ser estranho e até problemático, ficarmos com a dor e o desespero de outra pessoa. No entanto, quando alguém é indiferente é como se o outro não existisse e a sua vida não tivesse qualquer significado nem valor.
Ser indiferente aos problemas dos outros torna o Ser Humano desumano.
Até a fúria e a revolta podem contribuir para melhorar a vida dos outros, permitindo a escrita de uma grande sinfonia, ou a luta e a denúncia de aquilo com que não concordamos.
Já a indiferença, essa nunca é criativa e nunca muda nada.
A indiferença beneficia sempre o opressor e nunca a vítima, cuja dor é ampliada quando esta se sente esquecida e desprezada.
Os sem-abrigo que vivem na rua, as crianças e as famílias que vivem na pobreza, os mais velhos que não têm quem cuide deles, os jovens que querem constituir família, mas não conseguem emancipar-se da casa dos seus pais, todos eles precisam de ajuda, compreensão e solidariedade e não da indiferença da sociedade, que, afinal, somos todos nós.
Ao não nos empenharmos em encontrar soluções para estas pessoas, oferecendo-lhes uma réstia de esperança, estamos a apagá-los da memória humana.
E é por isso, minhas senhoras e meus senhores, que a resposta do estado social necessita da mobilização de todos nós, do Estado, das Autarquias, das IPSS e das Misericórdias. Todos devemos continuar a lutar pela humanidade, pela dignidade e pela liberdade dos outros porque assim estaremos também a lutar pela dignidade, pela humanidade e pela liberdade de nós próprios.
A par de um Ensino Público e de um Serviço Nacional de Saúde, de qualidade, universal e acessível a todos, devemos também bater-nos pelo Direito à Habitação para todos.
Neste 25 de Abril de 2023, ousemos sonhar e defender uma resposta integrada que assegure o direito à habitação.
Não é possível termos segurança, privacidade, saúde, paz e desenvolvimento humano sem condições de habitabilidade dignas.
A habitação em Portugal tem sido um dos setores mais secundarizados do Estado Social e o facto de termos apenas 2% de habitação pública ou social no nosso país, muito abaixo da média europeia, é uma agravante para as pessoas que continuam a viver em barracas, para os mais jovens, para as jovens famílias e para a classe média, sobretudo no Algarve e nas áreas metropolitanas de Lisboa e do Porto.
Perante as desigualdades territoriais e sociais em matéria habitacional, importa articular as diversas Estratégias Locais de Habitação de acordo com uma visão agregadora que sistematize e concretize o acesso à habitação, à luz de um Sistema Nacional de Habitação e de um Programa Nacional de Habitação, como ainda neste domingo nos propuseram Jorge Malheiros e Luís Mendes, geógrafos do Instituto de Geografia e Ordenamento do Território
A habitação é uma questão complexa, mas prioritária, sendo obrigação do Estado e de todos nós, assegurarmos a concretização do Direito à Habitação, com um verdadeiro pacto de regime entre os diferentes atores políticos e sociais, entre propriedade e habitação, com foco nas pessoas e numa sociedade mais justa.
O PS assinala por estes dias 50 anos da sua fundação, reafirmando o seu compromisso com o avanço de uma política de habitação, territorializada e descentralizada.
Este foi também este um dos desideratos do Programa do Movimento das Forças Armadas de Abril de 1974, ao defenderem uma nova política social com vista ao aumento progressivo, mas acelerado, da qualidade de vida de todos os portugueses. É por tudo isto que todos nós devemos continuar a lutar.
Viva ao 25 de abril,
Viva a Liberdade,
Viva Faro,
Viva Portugal!